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terça-feira, 2 de junho de 2009

Levantados do chão


Recomeços, de Lina de Albuquerque (Versar/Saraiva, 159 pág.)

Muita gente compra livros de auto-ajuda em busca de soluções fáceis para problemas pessoais. Se na era atual tudo é feito para tornar a vida mais fácil, da pizza delivery à lipoaspiração como forma de emagrecer sem exercício ou dieta, por quê não o livro?


Ocorre que a vida muitas vezes não é fácil; não há respostas iguais para pessoas diferentes, lições que sempre funcionam, saídas simples e indolores. O que mais ensina é a experiência humana: histórias verdadeiras, que tratam de problemas de todos nós, e se tornam inspiradoras, pois as respostas que ali encontramos são resultado da vida real em toda a sua complexidade.


É nesse segmento que se insere o recém-lançado Recomeços, coletânea de depoimentos recolhidos pela jornalista Lina de Albuquerque (Versar/Saraiva, 159 pág.). São relatos de 26 pessoas - algumas conhecidas, outras não – que tiveram de recomeçar a vida de certa forma. Na realidade, pode-se dizer que são 27 relatos, já que a própria Lina é um caso confesso, em função de uma tragédia pessoal: perdeu sua família num acidente de carro, no qual morreram seu pai, mãe e único irmão, além de um amigo da família.

Há recomeços provocados por tragédias, e outros não tão trágicos, porém importantes. Em todos os casos, o que há em comum é a sensação de que sair do fundo do poço ou levantar a poeira não depende exatamente da gravidade do que aconteceu ou do que está em volta, mas da capacidade individual de reação.

Uma pessoa pode sair de um drama pessoal destruída para sempre, assim como pode usar o que aconteceu como o próprio alimento para levantar-se. Nesse ponto, Recomeços é muito ilustrativo. Mostra de onde vem a energia vital, a fonte do espírito de luta que nos faz ter uma vontade de viver ainda maior, mesmo depois de grandes decepções, derrotas ou catástrofes.

As histórias são díspares: há melhores, há piores. Entre as piores, está a da apresentadora de TV e política Soninha Francine, que revela ter sido rejeitada pelas próprias filhas como mãe e afirma tê-las recuperado, porém sem contar de que jeito. Há histórias excelentes, mas já muito conhecidas, como a do pianista João Carlos Martins, que se tornou maestro e recuperou sua vida na música, depois da série de acidentes que, beirando a maldição, lhe tiraram boa parte do movimento das mãos.

As melhores histórias de Recomeços estão talvez onde menos se podia esperar. É tocante o depoimento da ex-chacrete Rita Cadillac, que revela no livro sua passagem pela prostituição, a incursão psicologicamente funesta pelo cinema pornô e por fim, já na maturidade, a recuperação da dignidade e do amor-próprio, ainda que temperados com uma dose um tanto dolorida de autoironia – como o desejo de ser sepultada de bruços, para ser reconhecida também na entrada do Paraíso graças à parte da anatomia que lhe deu fama.

Há também a história pungente de amor de dona Lily Marinho, que teve um casamento feliz na terceira idade com Roberto Marinho. Secreto apaixonado por Lily, o “doutor Roberto” esperou que ela enviuvasse de um grande amigo décadas a fio para declarar o seu amor. Lily narra as delícias de ter um grande amor, sobretudo numa fase da vida em que para muitos nada disso parece possível. E conta como lida com a perda na sua segunda e inestimável viuvez.


Prepare-se para emoções – e para pensar nos seus próprios desafios, fracassos e derrocadas, pois as comparações são inevitáveis. Mas é bom lembrar que, enquanto há vida, existe uma saída para tudo – basta dar o primeiro passo.