sábado, 21 de junho de 2014

O quê que a Costa Rica tem



Assisti aos dois jogos da Costa Rica, o primeiro contra o Uruguai, pela TV, o segundo contra a Itália, na Arena Pernambuco. Um jogo cujos ingressos só consegui comprar, creio, porque ninguém acreditava na Costa Rica, e acabou se tornando um jogo histórico.

Sim, ninguém dava nada pela Costa Rica, ainda mais no “grupo da morte”, reunindo Uruguai, Itália e Inglaterra. E o pequeno país da América Central, ao derrubar dois gigantes do futebol mundial em suas duas primeiras partidas, classificando-se na frente de todos e eliminando matematicamente a Inglaterra, realizou não apenas uma das maiores façanhas desta como de todas as Copas.

Na primeira partida, minha impressão é de que a Costa Rica havia tido muita sorte. A bola caíra no lugar certo na hora certa, como às vezes acontece no futebol. O Brasil já perdeu assim, em 1.982, diante da Itália. Um time mais poderoso, jogando bem, toma um gol de surpresa, quase por acaso, e de repente parece que tudo começa a dar certo para o adversário. Sem muito tempo de recuperação, quando se vê, Golias foi derrubado por Davi.

Na segunda partida, contra a Itália, estando na arquibancada, tive uma segunda impressão. A Costa Rica pode estar tendo sorte, mas também sabe mesmo jogar.

Não que seja algo de excepcional. Eles apenas fazem bem o que já conhecemos. Jogam em duas linhas de quatro, como muitos times brasileiros, e procuram compactar os jogadores, mantendo uma linha próxima da outra. Esse bloco fica mais adiante, quando querem pressionar o adversário, ou mais atrás, quando estão na frente do marcador e buscam jogar em contra-ataque.

No primeiro tempo, a Costa Rica corajosamente postou seus dois blocos mais adiante, para pressionar a Itália. Quando perceberam o espaço que os defensores costa-riquenhos deixavam às suas costas, usando como tática a linha de impedimento, os italianos quase abriram o placar por duas vezes em lançamentos de profundidade. Em um deles, uma precisa bola de Pirlo, o centroavante Balotelli desperdiçou um gol feito ao tentar encobrir o goleiro. Os costa-riquenhos tiveram também um pouco de sorte e ajuda do bandeirinha, que por algumas vezes marcou impedimento em lances legais do ataque italiano.

A Itália jogou bem o primeiro tempo, e poderia ter saído na frente, mas não conseguiu marcar o gol. A Costa Rica não perdeu a chance que teve, uma cabeçada certeira aos 43 minutos, que fez o time italiano, sem tempo de qualquer reação, sair de cabeça quente para o vestiário.

Na segunda etapa, já em vantagem, a Costa Rica recuou suas duas linhas de quatro mais para perto da própria área, fechando os espaços para os italianos, e jogando em contra-ataque. Fez bem ambas as coisas. Não marcou mais nenhum gol, mas anulou a Itália, que cansou com o calor pernambucano, entregando-se no final.

A Costa Rica mostrou ser uma equipe versátil, que sabe jogar tanto no ataque quanto na defesa. Possui jogadores habilidosos, como o centroavante Campbell, heroi do jogo contra o Uruguai, que nesta segunda partida teve participação mais discreta; e o meio-campista, autor do gol da vitória, que é o maior craque do time: Bryan Ruiz, jogador do PSV, da Holanda.

Contra a Itália, sem dúvida a Costa Rica não venceu por sorte, ou conjunção astral: venceu jogando, de igual para igual. Centrando seu jogo em Pirlo, um armador brilhante e clássico, mas meio lento, os italianos viram um adversário que usou a seu favor a velocidade. Ser rápido nos passes, no deslocamento e na virada de jogo é essencial no futebol moderno.

Além de velozes e bem entrosados, os jogadores costa-riquenhos são habilidosos e até um pouco abusados. Tentaram dar chapéu e dribles de efeito humilhantes nos honoráveis integrantes da velha Squadra Azurra. Talvez tenha contado para isso a preparação na Vila Belmiro, onde os costa-riquenhos foram beber da água que fez de Santos a meca do futebol-arte e da irreverência futebolística, na qual se formaram, entre tantos outros, Pelé e Neymar.

O técnico costa-riquenho, Jorge Luis Pinto, um colombiano que nos anos 1.970 estudou no Brasil e torce para o Corinthians, no final do jogo mostrou ter não apenas ousadia como elenco. Deu-se ao luxo de substituir seus dois melhores jogadores, Bryan Ruiz e Campbell. Enquanto isso, a Itália colocou em campo dois suplentes que não apenas nada acrescentaram ao ataque italiano como participaram de alguns lances bizarros, mostrando-se psicologicamente perdidos. Um deles, Insigne, segundo um amigo é apelidado na Itália de Scugnizzo, como se chamam os moleques de rua em Napoli. Ontem, porém, o espírito do moleque de rua, o alegre peladeiro, estava do lado da Costa Rica.

Surpresa para quem nunca tinha visto, os costa-riquenhos têm uma torcida grande e fanática por futebol. Lotaram parte do anel inferior da Arena Pernambuco como uma torcida organizada à moda brasileiro, e ocupavam esparsamente pelo menos um terço das arquibancadas. Outro terço era formado por italianos, numerosos mas espalhados, e o terço restante eram sobretudo brasileiros e mexicanos, além de torcedores de outras nacionalidades.

Ao final, a festa: os jogadores bailaram em campo na ponta dos pés, comemorando a travessa classificação em meio aos gigantes do futebol. No túnel de saída do estádio, os torcedores costa-riquenhos cantavam, felizes e provocadores:

“Donde están, donde están,
Los italianos que nos ivan a ganar?”

A Costa Rica não é a aparição de nenhuma nova ordem no futebol mundial. Porém, mostra que um time habilidoso, unido e bem preparado pode ir longe, mesmo sem tradição. Grandes momentos do futebol são feitos assim. A Costa Rica agora não é mais surpresa e vai ter vida dura pela frente. Porém, jogando um futebol à brasileira, até agora conseguiu ser melhor que o próprio Brasil, no futebol e nos resultados. Dá prazer vê-los jogar. E isso só valoriza o grande espetáculo de bom futebol que tem sido essa Copa.

Como é um dia na Copa

Levantamos às 4:20 da manhã, eu e meu filho, de 7 anos, para o nosso primeiro dia numa Copa do Mundo - dele e meu, que tenho 50. Objetivo, sair de São paulo num voo às 6:40, para assistir, em Recife, o jogo da Itália contra Costa Rica, cujos bilhetes eu comprara depois de muito suar diante do computador no site da Fifa, um mês antes, quando ninguém achava que a Costa Rica seria a sensação da Copa. Como descendente de italianos, eu, como muita gente, tenho a Itália em segundo lugar no coração, depois do Brasil - e venho tentando passar esse sentimento de italianidade para o pequeno André.

Saímos sonolentos, mas animados, e o voo transcorreu sem incidentes. No aeroporto de Recife, recebemos a notícia de que o transporte para o estádio era apenas de "metrô". Eu, que imaginara ir de táxi, entrei na fila do bilhete, na verdade uma pulseirinha vermelha que dava acesso aos trens e depois ao ônibus que completaria a viagem.

Dez minutos de caminhada na passarela que conduz do aeroporto à estação. O metrô, na verdade, não é um metrô, e sim um trem de superfície que vem de Jaboatão e segue até Recife, de onde se toma outra linha até a estação Cosme Damião, onde os organizadores prepararam os ônibus de ligação para a Arena Pernambuco. O estado do trem é razoável, melhor que os trens de subúrbio em São Paulo, e pior que os metrô paulistano. Tinha até ar condicionado, cujo efeito logo desapareceu assim que os vagões ficaram superlotados pelos passageiros locais, somados aos torcedores que enchiam o aeroporto e lotaram também o coletivo.

O trajeto de trem foi meio penoso: o trem, no sistema pinga-pinga, para não prejudicar o transporte da população local, levou cerca de 40 minutos com duas dezenas de paradas até Cosme e Damião. Mas o ambiente de alegria, com tanta gente misturada, se aliava ao bom espírito do dia para manter o moral elevado, sem a costumeira reclamação dos brasileiros que agora se queixam de qualquer incômodo. No trem, já tinha uma amostra do que encontraríamos no estádio: uma mistura de gente fantasiada, torcedores das mais diferentes seleções, italianos da Itália e outros do Brasil, seus descendentes, muitos torcedores do Palmeiras, o clube mais italiano entre os brasileiros. E a torcida costa-riquenha, em grande número, tão surpreendente quanto sua seleção.

Fomos em pé até Cosme Damião e, também em pé, num dos ônibus tirados das linhas comuns para fazer o transporte até o estádio. Saíam um após o outro em fila indiana até o estádio, num trajeto de cerca de mais 10 minutos.

A Arena Pernambuco foi construída no meio da zona da mata, fora da cidade. Chegar lá é mais ou menos como visitar um parque da Disney. O ônibus estaciona a cerca de um quilômetro do estádio, e essa parte do trajeto a multidão fez a pé. Antes da entrada, barraquinhas de comida e refrigerante dos recifenses eram o último contato com o Brasil. O estádio, que lembra uma espaçonave metálica descida no meio da mata, está longe de qualquer coisa, exceto de um condomínio de classe média alta que só se avista quando se sobe ao último estágio da arquibancada. pensei nos milhões dos estádios gastos com a Copa, e qual o futuro daquilo depois que a Copa acabar, mas, ora, ainda estávamos na Copa, e eu precisava deixar de ser jornalista por um instante para ser apenas torcedor de futebol.

Na revista, aonde passaram meu pequeno saco de viagem pelo raio-X, nos proibiram de levar para dentro qualquer tipo de comida ou bebida. Lá dentro, só comprando comida dos patrocinadores, o que significava tomar Coca-Cola ou água da Coca-Cola, Brahma e Budweiser. Não havia suco para crianças e nada para comer diferente de um hambúrguer do McDonald's e cachorro quente.

Eu tinha uma preocupação. Apesar dos meus esforços, comprar ingressos em setores diferentes do estádio. Minha esperança era de convencer o pessoal na entrada a entrar junto com meu filho e colocá-lo no meu colo. Mas não tive o menor problema. os bilhetes passavam na catraca juntos e, lá dentro, havia grande liberdade de movimentação.

O conceito da Arena é muito civilizado. estádio mais verticalizado que os nossos, permite ótima visão tanto de quem está no anel inferior quanto nos dois superiores. de qualquer ponto, pode-se ver bem o jogo. O fato de não haver alambrado entre a torcida e o campo pede dos torcedores um nível mais elevado de civilização, o que não sei se funcionará quando retornarem aos gramados os times do brasileirão e as torcidas organizadas. Na Copa, porém, todo mundo se comporta de forma exemplar.

Não precisei também colocar meu filho no colo. Com os 40 mil pagantes anunciados mais tarde pelos alto-falantes, havia claramente cerca de 20% dos assentos livres. Nos sentamos em dois disponíveis lado a lado e ninguém nos intimou a sair do lugar até o final.

Os italianos tinham uma torcida tão numerosa quanto a da Costa Rica, proém, estavam mais espalhados. Além de se encontrar por todo o estádio, os costa-riquenhos tinham um bloco organizado no setor mais próximo ao campo, barulhento e incansável, que animou o time do começo ao fim.

Em tudo, o estádio parecia um franchising bem americano, todo decorado com os motivos da Copa, a comida, os equipamentos brilhando de novos, do banheiro aos assentos de plástico. Um voluntário se ofereceu para colocar em meu filho uma pulseira de identificação, caso ele se perdesse de mim. Outros indicavam os assentos, como se estivéssemos no teatro. Cada um tinha seu lugar marcado, mas nada impedia que se pudesse mudar de um lugar para outro, até mesmo em outro setor, se houvesse lugares vagos. E não houve briga nenhuma.

Na saída, um congestionamento monstro de gente na fila para pegar o ônibus de volta levou cerca de 40 minutos, mas não baixou o moral da torcida, satisfeita e animada. Quando o ônibus passou pelo subúrbio, até chegar á estação do trem, o que se via era o Brasil de verdade lá fora, as famílias que faziam seu churrasquinho no quintal dos barracos e tiravam fotografias pelo celular dos ônibus que passavam com a torcida para fora da janela. Fizemos todo o trajeto do "metrô" na volta, dessa vez com meu filho sentado, ou melhor, deitado sobre um pernambucano bonachão, que não se incomodou quando caiu sobre seu ombro dormindo até babar.


Chegamos no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, às 11:20. Enquanto meu filho dormia no trajeto, fiquei pensando. O que achei, afinal? A Copa é um barato. Foi muito bom participar de perto, estar com meu filho no meio do bando de loucos de todas as nações, algo muito diferente de apenas assistir pela televisão. Certamente é algo de que ele vai se lembrar pelo resto d vida, provavelmente até quando eu não estiver mais aqui. E isso não tem preço.

Na Copa, pessoas realmente se divertem, fantasiadas ou não, como numa grande festa, em que o futebol é apenas um pretexto para uma grande confraternização. Todos querem conversar, trocam experiências e todo o resto. Como um amigo que encontramos a caminho do estádio e contou ter recebido de outro brasileiro, que o confundiu com um italiano, a proposta de trocar sua camisa da Itália por uma do Brasil.

Os pernambucanos, simpáticos já por natureza, se mostravam muito atenciosos e preocupados em fazer tudo para agradar os visitantes, da conversa no trem ao atendimento no estádio. E não pareciam nem um pouco incomodados de ver aquele famoso dinheiro gasto na Arena Pernambuco ter ido para o futebol, em vez dos hospitais ou escolas. Pelo contrário, estavam bastante orgulhosos de poder receber gente do Brasil e do mundo inteiro e interessados em saber se estávamos satisfeitos com o que tínhamos visto, como o pobre que coloca na mesa a melhor comida que tem em casa, orgulhoso de ter visitantes importantes. A conta, ou o que vai acontecer depois, não são tão importantes diante do nosso patrimônio de alegria e generosidade.

De certa forma, é isso o que o Brasil está fazendo: gastando mais do que pode para organizar uma festa melhor do que somos para que fiquem de nós com a melhor impressão. Mas é assim que se fazem todas as festas, ou não?









quinta-feira, 19 de junho de 2014

Pobre Espanha



Pobre Espanha.

Estive lá ano passado, numa caminhada a Santiago de Compostela, com meu pai. Um em cada três espanhóis está desempregado. As cidades do interior pelas quais passamos, ao norte, desde Pamplona, estavam praticamente abandonadas. O êxodo para os grandes centros em busca de trabalho só faz aumentar a dificuldade também nas metrópoles.

Lá, ao contrário do que se pensa aqui, o futebol não mascara as dificuldades políticas ou econômicas, é antes disso um pouco de alegria, um lenimento. O espanhol é um povo apaixonado por tudo, da tourada ao vinho, do vinho ao futebol, e é isso que sustenta os ricos clubes no país.O espanhol bem que estava precisando de um pouco de alegria. Porém, a seleção nacional de seu país, campeã do mundo em 2010, fez um papelão nesta Copa. Tomou sete gols em dois jogos e só fez um. "De noticia mala em noticia mala, nos pasa todo", lamentou o narrador da Rádio Cadena, de Barcelona, quando o time tomou o segundo gol chileno.

O celebrado futebol cadenciado da Espanha desmoronou diante de Holanda e Chile, duas equipes que, sem a mesma qualidade técnica, fizeram o que o Brasil já tinha feito na final da Copa das Confederações: não desperdiçaram oportunidades.

O futebol mortífero prevalece sobre o bem jogado. Holanda e Espanha foram efetivos, graças a atacantes que não titubeiam, e a jogadas rápidas de ataque, que não dão tempo para a defesa se organizar. Por jogar com uma troca exagerada de passes, a Espanha dá tempo para que a defesa se poste melhor. Seu futebol passou a ser previsível e o jogo enjoativo, com aquela troca de bola diante do paredão impenetrável feito pelo time adversário. E, nas oportunidades que teve, a Espanha não soube marcar.

Os espanhóis não foram os primeiros campeões a dar vexame na Copa seguinte. O Brasil, em 1.966, depois de vencer quatro anos antes, também saiu na primeira fase. A França fez uma campanha vergonhosa dentro e fora de campo em 2.002. A Itália caiu fora também logo de saída em 2.010. É a maldição dos campeões? Talvez. Mais provável, porém, é que exista uma acomodação na vitória. Ninguém vive do passado, muito menos no futebol.

terça-feira, 17 de junho de 2014

Não vamos nos desesperar



Não, não vamos nos desesperar.

Claro que o zero a zero diante do México não foi uma beleza, mas também não foi um desastre. O Brasil esteve um pouco mais consistente que diante da Croácia. O México apenas se defendeu. Deu alguns chutes, perigosos, é verdade, mas de longa distância. Era o que podia fazer. E o Brasil desperdiçou quatro boas oportunidades dentro da área.

Se a lógica ainda vale alguma coisa, podemos dizer que o Brasil está bem perto da classificação. Mas e o bom futebol? Sim, aquilo que gostaríamos de ver: o Brasil jogando bonito, e mais competitivo, com a pegada, a rapidez e a efetividade da Copa das Confederações?

O técnico Luis Felipe Scolari testou algumas mudanças que acabaram sendo ruins. Colocou Ramires no ataque, no lugar do contundido Hulk, para proteger mais o lado direito, muito frágil diante da Croácia. Resultado, não melhorou a defesa e perdeu um atacante. No intervalo, tirou Ramires para entrar Bernard. Depois trocou também Fred, que anda meio parado no ataque brasileiro. Nada surtiu muito efeito. No final, o México nos deu ainda um sustinho derradeiro.

A esta altura, Felipão já deve saber o que precisa fazer para o Brasil melhorar. Ele segurou Paulinho no time até agora, mas as coisas não estão andando bem para o ex-jogador do Corinthians. Com pouca mobilidade, foi o pior do time, tanto no desarme quanto na armação. E ainda perdeu um gol de cara com o goleiro. O Brasil jogou muito melhor na fase de preparação com Ramires no seu lugar. É o que deve acontecer de novo se Paulinho não melhorar.

Por que Felipão não deixou Ramires no lugar de Paulinho, passando-o para o meio de campo, tirando-0 para a entrada de Bernard no ataque? É difícil desvendar a cabeça de um técnico. Acredito que Felipão sabe que com Ramires no meio o Brasil joga melhor: tem mais mobilidade, velocidade e marca melhor. O técnico está apenas insistindo com Paulinho e pode ser que essa seja sua carta escondida na manga para a próxima fase. Essa seria uma boa surpresa para os adversários em um time que se tornou meio previsível.

É muito possível que ele d~e ainda mais uma chance a Paulinho. Felipão é fiel ao que gosta. Manteve Júlio César, confia no goleiro, apesar de não estar jogando em um grande time. Acredita também em Fred e no próprio Paulinho. Não se pode criticá-lo. Fez bem em não ceder a pressões imediatistas para tirar Oscar, que é hoje o nosso melhor jogador. Precisamos ter paciência, como ele vem tendo.

Contra o México, Neymar apareceu menos, mas foi bem. Quase marcou um gol, de cabeça, fundamento que não é o seu melhor. O goleiro mexicano, que fez uma grande partida, tirou a bola quando já estava praticamente dentro do gol. Neymar teve mais alguns lampejos, mas não se pode esperar que resolva sempre tudo sozinho.

O Brasil vai melhorar, até porque os adversários, a partir da próxima fase, precisarão atacar mais, uma vez que só passarão para a fase seguinte com vitória. É uma mudança importante. Com o mata-mata, todos os times serão mais agressivos, inclusive contra o Brasil. E isso criará mais espaços para o time brasileiro jogar.

O México conseguiu se defender bem. Fez um bloco compacto, amontoou jogadores ao redor de Neymar e bateu forte para inibir os jogadores brasileiros e truncar o jogo, não deixando-o correr. Fechou espaços pelas laterais, onde o Brasil tem armado seu ataque, e contou com a estrela do goleiro, que parecia imantado, atraindo todas as bolas que iam para o gol.

Este zero a zero foi pouco, é verdade, mas é normal a equipe ir se estruturando na primeira fase. Felipão ainda tem margem para fazer algumas experiências até as oitavas de final. Aí, então, é que a Copa vai, de fato, começar.

O que vale é bola na rede



Eu acreditei que o Uruguai chegaria à final. Contra o Brasil. Reedição de 1.950. O Uruguai tem um belo time, guerreiro, técnico, experiente. Foi o melhor sul-americano no mundial de 2.010, com um quarto lugar.

O Uruguai estreou contra Costa Rica, jogo bem o primeiro tempo, saiu na frente, tudo indicava um resultado normal. Aí o jogo virou uma dessas jornadas mitológicas, com tudo dando certo para a Costa Rica. Final, Costa Rica, 3 a 1. O Uruguai não só perdeu, como perdeu bem. O Uruguai passou a ter que ganhar de Inglaterra e Itália para se classificar sem depender de ninguém. A Copa desafia os gigantes.

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A Costa Rica teve Campbell, jogador do Olimpiakus. Já tinha ouvido falar? Nem eu. Um moleque esperto e sem medo com a bola no pé, ele foi o astro na vitória contra o Uruguai. Vai ser difícil a Costa Rica repetir o feito contra Itália e Inglaterra, mas quem sabe? Pelo menos por um dia, Campbell foi um herói do futebol.

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A Holanda massacrou a Espanha loga na estreia, com um placar cruel de 5 a 1, conquistado com um belo jogo e contra-ataques mortais. Parece que na derrota para o Brasil na Copa das Confederações, a mágica espanhola desapareceu. Aquele jogo quebrou sua espinha dorsal. Os espanhóis se arrastam agora em campo, sujeitos a outras humilhações. Podem ainda se levantar. Porém, quando o moral acaba, e a insegurança se instala, é muito mais difícil.

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Portugal também levou uma biaba da Alemanha: 4 a 0. Cristiano Ronaldo, o craque da hora, com seu penteado novo, foi uma peça decorativa no pouco utilizado ataque português. Para ficar mais feio, o zagueiro Pepe resolveu dar uma de valentão e foi expulso. Coitada da torcida lusitana. Nesta Copa, Portugal parece mais a Portuguesa.

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Os alemães têm o time mais bem preparado, que vem amadurecendo desde a última Copa, quando fizeram uma bela campanha. É um esquadrão bem organizado, rápido no ataque e mortífero na conclusão. Eu diria que, pelo futebol, é o favorito. Mas o bom futebol não é tudo para se ganhar uma Copa.

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Itália e Inglaterra fizeram a melhor partida até agora, como dois combatentes de guarda baixa, esmurrando um ao outro, para ver quem cairia primeiro. Caiu a Inglaterra, que cansou no final e não conseguiu reagir ao segundo gol italiano. Foram dois gigantes e prometem mais emoção.

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A Copa já teve grandes jogos, surpresas e muitos gols. Sim o futebol bonito está de volta. Até seleções tradicionalmente trancadas como Itália e Inglaterra jogaram abertas.

As partidas da primeira rodada lembram o que é mais preciso para ganhar qualquer competição de futebol: efetividade. Jogando bem ou não, ganha quem não perdoa. Aproveita as oportunidades. Essa frieza objetiva e implacável é o que resolve as partidas, sobretudo numa competição com times tão equilibrados. Como dizia o velho ditado, o que vale é bola na rede.
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E hoje tem Brasil e México!

domingo, 15 de junho de 2014

Messi, a promessa dele mesmo



Lionel Messi, o grande astro argentino, tido por muita gente como o melhor jogador do futebol contemporâneo, me lembra muito Zico, craque do Flamengo e da seleção brasileira, que teve seu auge nos anos 1.980.

Como Zico, que precisou de muita injeção para crescer, Messi é baixinho. Também como Zico em seu início de carreira, no Flamengo, o jogo de Messi é feito de descidas vertiginosas para o ataque, em profundidade ou na diagonal, graças ao drible em velocidade, finalizado pelo disparo mortal.

Nos clubes, ambos tiveram a sorte de jogar em grandes times, o que só faz o craque brilhar mais. No Flamengo, Zico tinha por companheiros jogadores como Andrade, Júnior e Adílio, que com ele levantaram um título mundial. Eram todos jogadores hábeis, que gostavam da troca de bola, da tabela, do futebol envolvente. O Flamengo de Zico era sempre o dono do jogo. Messi joga no superestrelado Barcelona, ao lado de outros craques com o mais fino trato da bola, como o campeão mundial Iniesta.

No começo da carreira, embora fosse já um craque no Flamengo, Zico era bastante criticado na seleção. Por muito tempo, dizia-se que desaparecia com a camisa amarela, por não repetir no Brasil o seu desempenho no clube. Com duas copas na bagagem, sem ganhar nenhuma, com atuações apagadas, embora seja o segundo maior artilheiro da história da sua seleção, Messi hoje recebe a mesma crítica na Argentina. É considerado mais um jogador de clube que de seleção.

Com o tempo, Zico mudou. Do jovem jogador que partia com tudo para o ataque na base do drible e da habilidade, tornou-se também um grande armador, ao mesmo tempo em que a experiência ia substituindo a juventude. Tornou-se um jogador praticamente completo, e, mais experiente, foi também um grande destaque na seleção. Teve a sorte de disputar duas copas ao lado de grandes jogadores, como Sócrates, com quem fez uma bela dupla. Não ganhou nenhuma, mas o time de 1.982, dirigido por Telê Santana, até hoje é uma referência do futebol brasileiro, bonito, bem jogado, que se não ganhou, por mera fatalidade, mereceu a taça mais que qualquer outro.

Messi também não ganhou Copa, ainda. E terá muito trabalho, porque não tem na seleção, ao seu lado, craques como os que tinha Zico. O time da Argentina, que hoje bateu por 2 a 1 a Bósnia, que mais parece um time de universitários, não foi muito convincente. Beneficiada por um gol contra bósnio, a Argentina teve um primeiro tempo apático e, se dominou o segundo tempo, não chegou a ter cara de time campeão, titubeando no final.

Ele fez um gol, a seu modo: carregando a bola, tirando os zagueiros da frente, até achar a brecha para o chute. Porém, na maior parte do jogo limitou-se a devolver para trás as bolas que vinham em sua direção. Pouco jogou para o time.

A Copa de 2.014 vai ser decisiva para a história de Messi. Se ganhá-la, pode equiparar-se a um Maradona, que conquistou uma Copa do Mundo pela Argentina num time guerreiro, mas tecnicamente mediano, o que lançou ainda mais sobre ele a fama de milagreiro, simbolizada pelo gol de mão feito diante da Inglaterra.

Messi pode, também, chegar perto de um Zico, se for mais solidário, contar com a ajuda dos companheiros, e fizer de suas partidas aquele espetáculo que deixa saudade nos apaixonados pelo futebol, mesmo se não ganhar nada.

Ou pode ser apenas apenas o que foi hoje, na sua partida de estreia na Copa de 2.014: uma eterna promessa dele mesmo.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

O renascido e o predestinado: a Copa começou



A Copa do Mundo começou, momento histórico, que carrega tanto do momento do Brasil.

Primeiro a festa, provinciana, sem inspiração, mais parecida com uma festa junina de escola que um evento mundial. Aquelas crianças pulando na cama elástica, o pessoal fantasiado de araucária, os gaúchos pilchados foram de um primarismo bem raso. Mas ninguém liga para festa de abertura de Copa do Mundo.

No fim, tudo ficou no seu lugar. A presidente Dilma, cuja popularidade vai descambando a olhos vistos, diante do festival de bandalheiras no seu governo, foi vaiada na hora da vaia. Foi até gostoso ver a cara feia dela, como a convidada indesejável da festa. Depois a torcida cantou o hino à capela, como sempre, lembrando à Fifa mais uma vez que o que vale é a lei do Brasil e, cantado, ele tem duas partes. Depois, apoiou o time, aparecendo nos momentos de necessidade.

Quem queria se manifestar se manifestou, do lado de fora. Má propaganda para o Brasil? O mundo inteiro já entendeu que protestamos contra a corrupção, os gastos absurdos, a prepotência e a corrupção da Fifa. O mundo está vendo que o Brasil tem cidadãos. Sim, apareceram os abusos de parte a parte, dos baderneiros que aproveitam as manifestações públicas para descarregar seu ódio, e da polícia, que carece de treinamento e profissionalização, agindo mais pelo instinto de auto-proteção que de proteção ao público.

Está sendo assim no Brasil como foi em todo lugar, até nos jogos olímpicos de Londres, com a milenar civilização inglesa, também cheia de hooligans e bagunceiros. Que por sinal já estão por aqui. Um deles tentou passar a mão na minha mulher em um bar e acordei com a cantoria de um grupo de torcedores bêbados nas ruas de Higienópolis às 4 da manhã.

Mas e o jogo? Ah, o jogo foi duro e teve grandes personagens. Numa estreia nervosa, como é normal, houve aqueles que estiveram abaixo da própria média. Especialmente os dois laterais: Marcelo, que marcou um gol contra logo no início, e Daniel Alves, que deixou uma avenida nas suas costas, e no ataque pouco produziu. Foi mal Hulk, desaparecido, apesar do seu tamanho. E Fred, isolado no ataque, teve como única participação o teatro até meio bisonho com que cavou o pênalti do segundo gol. O juiz japonês caiu na dele, sem com isso nos tirar o gosto da vitória.

Diante de uma equipe forte, física e tecnicamente, bem organizada e que planejou bem o estilo de jogo contra o Brasil, explorando os contra-ataques pelas pontas, o Brasil se safou pela grande atuação de Oscar, que vinha sendo questionado, com a sombra crescente de William às suas costas. Oscar jogou para provar a que veio na seleção Brasileira, e provou. Enfrentou os zagueiros, tomando-lhes a bola, no lance que resultou no primeiro gol. Obrigou o goleiro adversário a fazer uma defesa difícil, ainda no primeiro tempo. Caiu pelos lados, criando jogadas, indo à linha de fundo, muitas vezes sozinho. No final, num lance individual, fez o terceiro gol quando o Brasil tomava um aperto de botar o coração na boca.

E Neymar? O grande astro brasileiro jogou mal. Pouco acertou os passes, os dribles tão fáceis andaram escassos. Diante da muralha de adversários, porém, marcou o primeiro gol, uma bolinha murcha, chorada, mas que entrou no cantinho. Cobrou também muito mal o pênalti, à meia altura, meio fraco, e o goleiro também aceitou. Jogou mal, mas tem uma sorte incrível. Neymar é um predestinado. Com os dois gols, salvou sua atuação. E o Brasil.

Os croatas fizeram um belo jogo em campo, e fora dele um papelão. O técnico croata só falou do pênalti marcado contra sua equipe. E os jogadores quebraram mesas e encanamentos no vestiário. Coisa de mau perdedor.

Com Oscar, o meia ressuscitado, e Neymar, o predestinado, o Brasil mostrou que seus jogadores mais jovens são capazes de conduzir o time, tanto quanto os mais experientes, como o par de zagueiros. Paulinho, que vinha jogando pouco, vai sendo colocado por Felipão na esperança de ganhar ritmo até os jogos finais. Então o técnico terá de novo a equipe brilhante e competitiva que ganhou a Copa das Confederações.

Mesmo não jogando bem, numa partida crítica, o Brasil virou o jogo. Mostrou que pode reagir, individual e coletivamente.

Futebol é uma loteria, em que já vimos tantas vezes grandes times naufragarem por um pequeno detalhe. Sim, a vida é cruel. Mas temos chances reais de vencer.