Eu não gostava do Zagallo. Achava o homem arrogante e ultrapassado. Na Copa de 1970, eu era muito criança e lembro mais do último jogo, pela grande festa. Naquela Copa, ele parou no tempo. Em 1974, de que me lembro mais, o Brasil tomou um samba da Holanda, que jogava como deveria jogar o Brasil. Parecia um time da rua, jogando pelada. Fizeram uma paródia da música da Copa de 70 para hostilizá-lo. Lembro até hoje: "Todo mundo de porrete na mão/esperando o Zagallo/sair do avião".
Como ele mesmo disse, tivemos de engoli-lo por muito tempo. Ele tinha razões para ser arrogante: bi campeão do mundo como jogador, tri como técnico, tetra como coordenador, era o mais vitorioso e quem tinha mais experiência nesse negócio de ganhar um torneio traiçoeiro, em que o melhor geralmente tropeça num time retranqueiro qualquer. Dizia ter sorte, amava o número 13, mas era na verdade um especialista, que conhecia Copas como ninguém.
Não obstante, a morte de Zagallo me bateu como uma grande tristeza. Ele tinha algo incomparável: o amor incondicional pelo Brasil, o entusiasmo pela seleção, e certeza da nossa grandeza, em um esporte que passou a ser nosso, e mais, prova de que o Brasil pode tudo, em qualquer coisa.
Zagallo era isto: uma injeção de ânimo num país que, como dizia Nelson Rodrigues, passou do viralatismo para provar o gosto da vitória. E quem sabe realizar outros projetos de grandeza, como oferecem nossos imensos recursos humanos e naturais.
Simbolizava a emancipação do viralata brasileiro, da qual ele se tornou a instituição encarnada. Receio que sem Zagallo esteja perdido o grande bastião dessa devoção à pátria, esse orgulho que beira a arrogância, essa vontade e certeza de ganhar, e amar incondicionalmente o que é nosso, acima de vitórias e derrotas. Hoje, Zagallo, eu que nunca gostei de você tiro meu chapéu e digo: que falta você nos faz.
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