Sento no chão da pérgola da casa do meu pai, Alípio: conversamos ao ar livre, porque ele tomou só a primeira dose da vacina contra o vírus e eu ainda não. Volto e meia venho vê-lo, a certa distância: sinto falta das conversas pessoais, das quais eu sempre tiro alguma coisa. É como visitar um velho oráculo, o único talvez capaz de me entender - e aceitar.
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021
A natureza dos relacionamentos
Sento no chão da pérgola da casa do meu pai, Alípio: conversamos ao ar livre, porque ele tomou só a primeira dose da vacina contra o vírus e eu ainda não. Volto e meia venho vê-lo, a certa distância: sinto falta das conversas pessoais, das quais eu sempre tiro alguma coisa. É como visitar um velho oráculo, o único talvez capaz de me entender - e aceitar.
terça-feira, 9 de fevereiro de 2021
Nunca fomos tão felizes
Foram sonho, paixões incandescentes
E, juntos, nunca – nunca! – fomos tão felizes
Foram amigas, amparo, companheiras
Dos dias difíceis como dos risonhos e floridos
Deram-se a mim em tudo e tão inteiras
Em favores e amores nunca esquecidos
Hoje eu sinto aqueles dias ainda vivos
E se pudesse daria uma vida a cada uma
Amo a todas guardando-as nos livros
Como as mãos no mar juntam a espuma
(São Paulo, fevereiro de 2017)
domingo, 31 de janeiro de 2021
Abel x Cuca: temos muito a aprender
Ambos os técnicos entendem de futebol e armaram bem o jogo para a final, que assim foi equilibrada, quase sem emoção, como um jogo de xadrez, até o final. O que decidiu o resultado foi a postura de cada treinador.
Cuca é um grande técnico, um ser humano caloroso e uma pessoa de boas intenções. Mas sua postura na final prejudicou o time e a ele mesmo.
Já Abel é uma grata surpresa para o futebol brasileiro, assim como os jovens promovidos da base palmeirense, que, além de qualidade, mostraram ter estrela de campeões.
O jovem treinador português articula muito bem, é inteligente, aplicado, e se permite também ser emocional. Tem todos os ingredientes de uma liderança construtiva.
E ainda é humilde e realista. Ao chegar, admitiu que não tinha grande experiência e não fugia do fato de nunca ter ganhado um título.
Pois agora tem um. O mais fera, por sinal.
Um bom exemplo do tipo de gente que produz um país onde há educação - mãe da sobriedade, do equilíbrio e do profissionalismo. Com quem nós, brasileiros, temos também muito a aprender.
sábado, 9 de janeiro de 2021
Conversa de adulto sobre crianças
terça-feira, 29 de dezembro de 2020
Clarice: não há glória depois da morte
Ótimo. Contudo, chama a atenção que ela, em vida, nunca tenha sido tão conhecida, nem reconhecida. A meu ver, esse sucesso póstumo nos devia fazer pensar sobre como tratamos os escritores brasileiros, para não dizer os artistas em geral, quando eles ainda não são um nome no cemitério.
Clarice morreu na miséria e menosprezada pela crítica. No seu tempo, diziam que seus textos estavam no meio do caminho. Não se desenvolviam como romances ou contos, portanto não eram bons contos, nem se reduziam a poesia, portanto não era boa poesia. Nem uma coisa, nem outra, Clarice não era nada.
Ela não foi a única que sofreu. Para dar mais só um exemplo, Mario Quintana viveu de favor na velhice - habitava um quarto no hotel do jogador de futebol Paulo Roberto Falcão, que era seu admirador, e assim livrou o poeta gaúcho, literalmente, de ir para a sarjeta, em Porto Alegre. Clarice, nem esse suporte chegou a ter.
De forma geral, o brasileiro fala mal do brasileiro, mais ainda na literatura. Quais são os grandes escritores brasileiros vivos? Faça essa pergunta e você verá todo mundo engasgar. Será que entre 200 milhões de concidadãos não existe nenhum, ou isso é porque ninguém lê, nem fica sabendo?
Esse preconceito começa no próprio meio. Escritores não dão suporte e não promovem outros escritores. A crítica nunca vê o que há de bom na produção nacional - só faz criticar, talvez sugestionada pela própria palavra. Quem publica livro, como eu, ou faz música, do Zé da Esquina ao Caetano, já experimentou desse fel.
Fala-se do negro, do índio, do pobre, do gay, mas a maior discriminação no Brasil é contra a inteligência.
Não faz muito tempo que escrever, sobretudo ficção, se tornou uma atividade profissional, especialmente no Brasil. O romancista Guimarães Rosa era médico. Vinícius de Morais, diplomata. Antes, escrever era uma atividade diletante, que se fazia nas horas vagas.
Escrever no Brasil só se tornou uma atividade profissional e suficientemente remunerada nos anos 1970. Porém, aos poucos, a fase supostamente romântica em que aqueles que só escrevem estão condenados a passar fome está voltando.
A chegada do livro digital, facilmente copiável, vai destruindo toda a indústria do livro. Hoje há também acesso fácil a um universo de conteúdo, o que faz a disputa pelo leitor se tornar mais acirrada.
Há ainda uma proliferação de amadores que polui as estantes virtuais. Assim como na fotografia, todo mundo virou escritor, da noite para o dia. E qualquer um pode se "autopublicar".
E, pasmem, é justo nessa era de declínio da literatura como arte que se redescobre Clarice. Como ela já morreu, recebe agora uma chancela que aos vivos não se dá.
Pena que ela não tenha vivido para desfrutar do seu sucesso. Mas a realidade é essa. O brasileiro só dá valor ao brasileiro quando é tarde demais.
Nosso hábito de rebaixar a cultura brasileira é parte do nosso complexo de inferioridade geral. Adoramos qualquer porcaria que vem de fora e, assim, a cultura nacional enfrenta o descaso do mercado.
Há também pouquíssimos autores brasileiros vendidos no exterior, assim como há poucos filmes brasileiros com carreira internacional. E mesmo esses, como Paulo Coelho, são vilipendiados.
A cultura é a vanguarda de um povo. Coloca o país em todo o mundo, abre portas, caminhos, fronteiras. Mas, para que seja disseminada pelo planeta, precisa ser valorizada primeiro dentro do próprio país. Nada vai adiante com um povo que só fala mal de si mesmo e de seus intérpretes. Ou que só lhes dá valor quando é tarde demais.
A indústria cultural brasileira é de uma mediocridade explanatória sobre a nossa mediocridade geral. Para fazer filmes, ou séries baseadas em romances brasileiros, por exemplo, só ouço gente reclamando que o governo não dá dinheiro, como se a arte dependesse de governo.
A arte é independente, se for patrocinada pelo governo, chapa branca, deixa de ser crítica, deixa de ser arte. Existe um mercado global a ser explorado, mas para isso temos de ter outra mentalidade, sem paternalismo, com mais vontade, mais ambição.
Para expandir a literatura e a arte brasileiras, é preciso lhes dar o devido valor. Como fazem, como exceção nacional, os baianos, que têm uma bem azeitada e positiva indústria cultural, onde um ajuda o outro e se fazem sucessos como linha de série, especialmente na música. Os baianos são um exemplo a seguir, como não se vê em São Paulo, no Rio de Janeiro ou qualquer outro lugar do país.
É necessário que se promova o autor, e que o reconhecimento não venha depois que morrer. Para o bem da cultura brasileira, da valorização do país, e do nosso progresso como civilização. E dos autores e artistas, claro, porque a glória, na morte, deve ser algo muito chato.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2020
O segredo para escrever bem
Como digo no livro: escrever é pensar. O resto é datilografia. Para escrever bem, é preciso pensar bem. Definir a ideia principal. Desenvolvê-la de forma encadeada, de uma forma fluida e lógica. Para isso, é preciso desenvolver o pensamento organizado. Tudo fica mais fácil quando já temos tudo bem claro dentro de nós.
O exercício de escrever nos leva a desenvolver a forma de pensar. E pensar de maneira estruturada nos ajuda a estruturar, desenvolver e enriquecer o texto, além de escrever sem embaraços, com naturalidade.
Por trás do déficit da redação no Brasil, há, portanto, uma dificuldade de pensar. Para escrever bem, é preciso antes de mais nada ter algo a dizer. E, para ter algo a dizer, é preciso ter informação, refletir sobre ela, exercitar a capacidade de distinguir o mais importante, além de transformar o importante em interessante.
Nos Estados Unidos, as crianças são educadas com o livro. Na França, o livro é considerado a essência do próprio país. Em ambos os países, as crianças exercitam cedo, na escola, a leitura, a redação e a interpretação de texto.
Os livros não ensinam apenas o que dizem, como ajudam a pensar, e pensar de uma forma estruturada. Quando já refletimos muito sobre um assunto, é fácil discorrer sobre ele. Escrever se torna então tão simples como falar. Ninguém pensa antes de falar. Escrever pode ser assim também, uma transmissão direta do pensamento. Como afirmo no livro, escrever é pensar no papel.
Quando temos dificuldade de escrever sobre algo, colocamos a culpa na dificuldade da redação. É mais difícil admitir que a ideia não é boa ou que não temos algo realmente relevante a dizer. Seria apenas uma dificuldade de expressão.
A realidade, porém, é que a dificuldade em escrever vem da dificuldade em pensar. Diante da falta de ideias, muita gente apela para uma linguagem complicada, cheia de jargões e academicismos, por exemplo. Escrever difícil, porém, não disfarça a falta de ideias. Só cria um problema a mais.
Na luz, as ideias aparecem. É essencial, portanto, boas ideias. Escrever nos obriga a melhorar, se não quisermos passar vergonha.
Quando o texto não avança, temos de buscar mais informação, ou repensá-la. Esse exercício é que nos leva ao desenvolvimento pessoal. Mostramos, ao escrever, o que somos. E isso nos obriga a melhorar.
Quando há uma boa ideia, ou algo relevante, a clareza valoriza o conteúdo. É como dizia, belamente, o padre Antônio Vieira: "O estilo pode ser muito claro e muito alto. Tão claro que o entendam os que não sabem e tão alto que tenham muito que entender os que sabem.”
Escreva Bem, Pense Melhor, fornece um roteiro para esse desenvolvimento: escrever para pensar melhor e pensar melhor para escrever. Não se trata portanto de um manual de redação, e sim de um guia para o desenvolvimento pessoal.
Seus conceitos são baseados na minha experiência de mais de trinta anos como autor e editor, tanto de livros de ficção e não ficção quanto de imprensa.
Pela minha mão, como editor, passaram textos de muitos jornalistas, profissionais de primeira linha, que nem por isso às vezes deixam de ter suas dúvidas, e autores de livros de ficção e não ficção, muitos deles premiados e best sellers.
Todo esse meu aprendizado, tanto ao escrever como ajudando outros a escrever, serve agora neste livro para quem quer encurtar o caminho para fazer textos de sucesso.
Como se trata de organizar o pensamento, Escreva Bem, Pense Melhor serve para qualquer tipo de texto - de um simples e-mail profissional a um romance. Ajuda também a desenvolver um estilo próprio, usando a capacidade instalada que todo mundo tem, ou pode adquirir.
Escrever é um exercício constante e nada acontece do dia para a noite. O padre Vieira, conhecido pelos seus célebres Sermões, diria que esse é provavelmente o único trabalho onde não há milagre. Porém, neste livrinho, como uma pequena bíblia, está um bom caminho para a salvação.
Para comprar:
terça-feira, 22 de dezembro de 2020
A herança de 2020
Acredite: 2020 teve algo de bom.
A pandemia tirou muitas vidas. E tirou muito das nossas vidas. Porém, com isso, algo muito importante aconteceu.
O mundo caminhava para muita intolerância, filha de pobreza, geradora dos muitos radicalismos. A pandemia, apesar de alguns, nos aproximou.
Fez lembrar o valor dos entes queridos. E a importância de todas as pessoas, sem distinção.
Fez a gente sentir falta de gente. Desarmou ânimos. Como só acontece nas horas difíceis que alcançam a todos, lembrou que a Humanidade e a nossa humanidade estão acima das diferenças.
Ressurgiu o espírito de amor e da solidariedade. Cada vez que a truculência, a incompreensão e a intolerância se manifestaram, parecia algo bestial, extemporâneo, inadmissível, sem sentido. É um começo. Ou recomeço.
Isso se refletiu na política, onde se faz a gestão da vida coletiva. O radicalismo ideológico passou a ser defletido, claramente arrefeceu. Baixamos a guarda.
Olhamos para os doentes, os frágeis, os necessitados. Revalorizamos os mais velhos, um patrimônio humano que de repente ficou ameaçado.
Muita gente diz que a velhice tira o trabalho, o respeito, a importância social. Mas antevimos como um mundo sem os velhos é impensável.
A pandemia lembrou a todos de como eles são fundamentais. 2020 foi o ano de preservar e trazer de volta a sabedoria e o amor, que os mais velhos aprendem a cultivar. Para a liderança, o conselho, o nosso equilíbrio, a nossa felicidade. E o bom funcionamento do mundo.
Aprendemos novamente a lidar com a tragédia, recolocando a vida humana acima das preocupações cotidianas e de interesses comerciais.
Olhamos para nossos pais, filhos, amigos e irmãos como pais, filhos, amigos e irmãos. E olhamos os desconhecidos, especialmente os desvalidos, como seres humanos, gente como a gente. Assim, voltamos a ser gente, também.
Olhamos os números, sabemos que somos um deles, mas enxergamos neles as pessoas. Lembramos que somos iguais e que a grande tarefa social é tratar todos os diferentes como iguais, e os iguais como diferentes. Para que todos possam ter os mesmos direitos e oportunidades de desenvolver suas capacidades únicas, individuais.
2020 foi o ano em que a tecnologia digital provou seu bem maior. Ligou cada casa a uma cidade, cada cidade à Nação, e todas as nações na busca por uma resposta a uma ameaça tanto coletiva quanto individual.
A pandemia expressou como a vida de cada um depende da vida de todos, e vice-versa. Este foi o ano em que tivemos de pensar no outro e convencer os refratários de que pensar na coletividade é salvar a nós mesmos.
A conexão virtual expôs de forma cristalina e deu o último estágio de desenvolvimento à própria essência do que é a Humanidade.
Diante de uma doença cruel, que nos coloca em perigo ao fazer aquilo é mais indispensável - respirar - e nos mata literalmente extraindo nosso oxigênio, voltamos a valorizar as coisas simples e elementares. Sair à rua. Encher os pulmões de ar puro. Olhar a natureza. Tomar sol. Dar um abraço.
As crianças perderam muito da escola, da convivência, da infância. Mas ganharam essa vivência, que ainda servirá.
Grandes tragédias podem ser um grande impulso para o futuro. Este planeta nunca foi tão civilizado quanto depois da Segunda Guerra Mundial. Conflitos existiram, mas progrediu como nunca a riqueza, a saúde, a lei, o concerto dos povos.
Atingimos tanto progresso que ele acabou gerando também grandes distorções. Temos de usar o aprendizado, novamente, para uma próxima etapa.
Vamos precisar dessa nova solidariedade para progredir outra vez. A miséria crescente, a exclusão social, a crise ambiental pedem esforços tanto individuais quanto coletivos, possíveis por essa nossa nova e grande facilidade de conexão.
A consciência de que o bem de todos é o nosso bem remete à necessidade de retomarmos a valorização dos direitos essenciais. A saúde, o trabalho, a educação são os motores não da economia, como da própria civilização.
Do bem estar coletivo, com desenvolvimento humano e social, depende o bem estar individual. Ainda mais no mundo super conectado, em que todos se mostram a todos, não há mais como viver bem enquanto o outro não estiver bem, igual.
Podemos lembrar de 2020 somente pela perda de entes queridos, ou ter em mente que nós, os sobreviventes, temos ainda a oportunidade de fazer mais. E que a grande e verdadeira obra é o bem coletivo, porque, de nós, é o que vai ficar.
Para mim, este ano, Natal e o Ano Novo são a celebração de um novo nascimento para todos. Agradeço pela vida. E a parentes e amigos, incluindo aqueles que se fizeram amigos como meus leitores, por tornarem a vida tão boa.
Pelo mesmo motivo, agradeço a todos aqueles que estão conosco agora somente em espírito. Criaram este mundo que nos cabe continuar. E aconselham, acompanham, aquecem o coração.
Por último, convoco todos a fazer uma promessa, como eu mesmo faço. A de que estes tempos duros sirvam de forma duradoura para esse entendimento e, assim, a real construção de um futuro melhor. As agruras terão valido a pena, para nós, aqueles que se foram e os que virão depois.