O café fumega em cima da mesa na livraria Martins Fontes da Paulista, onde um amigo vai tirando o chapéu e já senta querendo dizer o que andam falando de mim.
quarta-feira, 4 de setembro de 2024
Eu, o polêmico, e a Assírio & Alvim
O café fumega em cima da mesa na livraria Martins Fontes da Paulista, onde um amigo vai tirando o chapéu e já senta querendo dizer o que andam falando de mim.
quarta-feira, 21 de agosto de 2024
Gloriosos fracassos
Gosto mais dos meu fracassos que dos meus sucessos.
não que tenha muitos ou mais que ninguém.
mas dos que tenho, eu gosto.
Gosto dos meus fracassos e digo que fracassei com um sorriso satisfeito
porque gosto deles.
Gosto dos meus fracasssos porque eu acreditava neles.
porque eu pensava grande. e foi melhor fracassar querendo tudo que defendendo o pouco.
Porque viver é arriscar.
e o resultado importa menos que viver.
Gosto dos meus fracassos porque doeram. E não escondi a dor.
experimentei, vivi a dor, para superar a dor.
com a dor aprendi a me curar, a me entender e saber melhor onde vou.
Gosto dos meus fracassos porque eu caí – e caio – de pé.
Gosto dos meus fracassos porque por trás deles há sonho e boas intenções.
Gosto dos meus fracassos porque eles me deixam mais próximo de quem nos faz boa companhia.
Gosto dos meus fracassos porque os esforços nunca foram por vantagens ou dinheiro, e sim por causas que eu achava boas.
Eu gosto dos meus fracassos porque pessoas me ajudaram e o seu esforço me deixa grato, me enternece, me faz querer retribuir com algo melhor.
Eu gosto dos meus fracassos porque me parecem melhores que o sucesso de muita gente.
Eu gosto dos meus fracassos porque ninguém pode dizer que desisti.
Gosto dos meus fracassos porque eles falam mais sobre quem eu sou que os meus sucessos.
Gosto de meus fracassos porque ele nunca deixam que eu me acomode.
Gosto dos meus fracassos porque neles ostento meu orgulho, assim como prefiro a humildade comedida nos sucessos.
Eu gosto dos meus fracassos porque são a oportunidade de tentar de novo e melhor.
Eu gosto dos meus fracassos porque a gente na verdade nunca perde.
a gente ganha.
ou aprende.
sábado, 17 de agosto de 2024
Uma tarde de bom futebol
segunda-feira, 12 de agosto de 2024
O jornalismo e o vendedor de bombons
Dia dos pais, e estou num almoço com meu filho, 17 anos, meio incerto da profissão a escolher no vestibular deste final de ano, e meu pai, de 89, um bem sucedido aposentado.
- Sabe como eu escolhi minha profissão? - diz o avô ao neto. - Graças ao dono da bomboniere.
Conta a história meu pai, Alípio. Quando ele tinha pouco mais que a idade do meu filho, foi trabalhar no cinema do tio Amaral, que era padre e vigário da Igreja de Nossa Senhora das Dores, na Casa Verde.
O cinema de bairro servia para trazer um dinheirinho a mais ao caixa da paróquia. Nas famílias tradicionais de origem mineira, geralmente o filho mais inepto para os negócios virava padre. No caso dos Amaral, família de minha avó, por algum erro vocacional, o tio padre era um grande negociante, que tinha vários empreendimentos, incluindo emprestar dinheiro a juros usurários. E o cinema.
Como alguém de confiança da família, papai virou o gerente. Cuidava do caixa e fazia a bilhetagem, conferida pelo fiscal da prefeitura, disfarçando algumas malandragens - por exemplo, deixava entrar de graça para ver os filmes uma moça na qual estava interessado, chamada Marlene, que depois seria sua mulher e a minha mãe. Quando passavam os filmes, ficava longo tempo ali, sem fazer nada. Batia papo com o vendedor de bombons, que alugava o balcão na sala de espera do cinema.
O homem da bomboniere tinha um segundo emprego: vendia anúncios para A Hora, um jornal sensacionalista, que dava sobretudo notícias policiais. Meu pai, que fazia Odontologia na Faculdade de Medicina da USP, para satisfazer minha avó, que queria um emprego seguro e tranquilo para o filho, achava maçante passar o resto da vida vendo pessoas de boca aberta numa cadeira odontológica.
- Será que você não arranja um emprego lá para mim? - perguntou papai.
- E o que você sabe de jornalismo?
- Eu sei ler - disse meu pai, lembrando que corria antes de todo mundo, quando menino, para pegar o jornal que o entregador deixava na casa do pai dele, meu avô.
O vendedor de bombons pensou, e disse:
- É o bastante.
Assim, meu pai conseguiu seu primeiro emprego, como repórter de A Hora. Diz que não gostava de cobrir a área criminal, assunto pesado, penoso, mas adorou o jornalismo. Praticou-o por setenta anos - e deu a meu filho seu único conselho para encontrar uma profissão:
- Experimente!
sexta-feira, 9 de agosto de 2024
Jardim japonês
JARDIM JAPONÊS
No castelo de Niho-jo o grande shogun reina:
entre a política e a guerra há um filho que nasce
cuidado a cada dia como o jardim
onde ele respira a beleza pura da vida
entre a política e a guerra
O shogun dorme ao lado da katana luzidia
porque quem repousa não é o homem
é o guerreiro
A lâmina reflete quem é
brilha no escuro
vela seu sono à noite
O alvorecer levanta da sombra dos muros ajardinados
o shogun se veste como um samurai
é um samurai
Somente o semblante altaneiro
diz que é o shogun:
senhor dos campos de arroz
na planície banhada pela água pelos rios
quem vêm das montanhas verdejantes
com suas responsabilidades
e sua coragem
O coração está abrigado
no relicário que é o palácio de madeira encaixilhada
paredes decoradas de pinturas em laca
cercada pelas muralhas de pedra perfeitamente engastada
e o fosso de água limpa e fresca ao redor da murada exterior
Pesa saber que dele tudo depende
mas há também leveza na brisa da manhã:
dá valor a cada dia
às coisas grandes e pequenas
(e então ele ouve as mulheres cantando ao longe
suave recompensa pelo seu trabalho duro)
Todos os entes têm dentro de si o kami:
o espírito divino está com ele quando caminha em silêncio
acompanhado dos kamis do sol, da luz, das árvores
e do lago de pedras pontiagudas e rudes ferindo agrestes
a harmonia do plácido cenário
onde as folhas das árvores sustentam o céu
Para que a guerra senão o inevitável equilíbrio
a harmonia
a paz como deveria ser
Para que o poder
senão para dividir
alimentar
cuidar
apenas viver
Para que a riqueza
senão para a saciedade
e a garantia do dia seguinte
Para que o sonho
senão dar mais valor
ao que de outra forma
se pode perder
desperdiçar
esquecer
Para que querer
o que é possível
se o impossível está diante de nós
e tudo temos em nós
para alcançar o horizonte
Magokoru: coração sincero
para o shogun não há medo
e não existe o amanhã
toda o esforço humano é nada diante da simplicidade
Para o shogun
a morte é continuidade da vida
e a única obra verdadeira
é o eterno
ser
sexta-feira, 2 de agosto de 2024
Um café em Akihabara
terça-feira, 16 de julho de 2024
O culto à vida e o desenvolvimento
Em 1920, o imperador Meiji cedeu ao fato de que era preciso modernizar o Japão. Como um rito de passagem, mandou construir um templo xintoísta no meio de uma floresta de 70 hectares dentro de Tóquio: o Meiji Jingu, onde hoje repousa seu espírito, com o da imperatriz Shoken.
Na entrada, após os Torii (portais), duas estranhas galerias ladeiam a alameda que leva ao templo. Como marco da mudança, do lado direito, estão barris de saquê, que o Japão exportava; do lado esquerdo, barris de carvalho com vinhos da Borgonha, trazidos da França. Um espécie de símbolo da abertura ao comércio internacional, celebrado com a bebida.
O shintoísmo é uma religião antiga, de origem incerta, sem livro, profeta, batismo, conversão. Baseia-se no princípio de que todos os seres são espíritos a serem respeitados, uma forma de harmonia com toda a natureza. Essa ideia fundamental está por trás de toda a cultura japonesa.
Meu filho, que sempre foi sábio desde pequeno, definiu o xintoísmo como "um culto à vida". E é isso mesmo: enquanto outras religiões buscam a conexão com o além, o mistério, o insondável, o shintoismo venera a natureza, isto é, o que existe, a vida.
O templo do imperador revela a conexão entre essa filosofia e a forma encontrada para que essa sociedade tradicionalista e ritualista se adaptasse e permitisse o desenvolvimento. Respeitar a tradição usando-a em favor, e não contra o progresso, é a verdadeira semente do Japão contemporâneo. Um país onde há muito trabalho duro, mas que ocupou um lugar importante na economia mundial, realizando o projeto do imperador cujo legado aqui se encontra vivo, embalado por uma paz sobre a qual se caminha de coração tranquilo.