A reserva de mercado intelectual não existe. E o leitor comete um homérico engano, primeiro, porque eu não sou jornalista, ou só jornalista. Ser jornalista e ter trabalhado em veículos da grande imprensa pode até chamar mais a atenção no meu currículo. Porém, minha verdadeira formação é de Ciências Sociais. Sou bacharelado pela USP em Sociologia, Antropologia e Política, que completei antes mesmo de me formar na ECA - Escola de Comunicação e Artes, com especialização em Jornalismo.
Graças a minha formação, creio que pude escrever melhor, incluindo em jornalismo, e no jornalismo que se faz tendo o livro como veículo. Com a antropologia, por exemplo, pude escrever melhor sobre os índios que viviam no Brasil, entender seu relacionamento com os portugueses e muitos aspectos da vida indígena. A leitura de mestres, como os antropólogos franceses Pierre e Helène Clastres, foi essencial para escrever A Conquista do Brasil. Outros intelectuais com quem tomei contato pela primeira vez na faculdade, como Darcy Ribeiro, tiveram igual importância. Minha experiência pessoal entre os Kuikuro, no Xingu, também foi de enorme valor.
Elementos de sociologia e política foram fundamentais para analisar a construção da sociedade pré-colonial do Brasil e do aparelho de Estado. A corrupção, tema dominante no Brasil de hoje, tem suas raízes na própria criação da elite brasileira e sua mentalidade, responsável pela manutenção do Brasil no atraso do qual custamos a nos livrar.
O Jornalismo? A prática de escrever diariamente na imprensa, com a máxima objetividade possível, nos ajuda a redigir com mais clareza, identificar e dar destaque ao que é mais importante. Surpreender o leitor é outra regra de ouro da boa redação. Tenho procurado exercitar tudo isso ao longo de meus trinta anos de carreira como jornalista. Acho que isso não desmerece um autor. Ao contrário, também o credencia.
De certa forma, A Conquista do Brasil é mais uma reportagem com pinceladas de ensaio sociológico do que um livro de História. Ao resgatar os documentos originais de viajantes, jesuítas e mandatários, procurei reaproximar o leitor da realidade daquele tempo. Surgiram novos aspectos da história, esquecidos ou menos lembrados ao longo dos séculos, que ajudam a entender nossas origens e como somos ainda hoje. O livro mostra que o tempo acabou distanciando a história do Brasil de suas fontes originais e criou uma falsa ideia do brasileiro sobre ele mesmo.
Há uma terceira influência no que faço, que é a da literatura. Já faz algum tempo que não publico romances (o último, que saiu pela Objetiva, foi Amor e tempestade, em 2009, e o próximo deve sair no começo do ano que vem). O exercício da ficção também ajuda a escrever melhor: criar o clima, fazer o leitor visualizar a informação, mostrar o contexto de forma rica e envolvente. Tudo isso colabora com a redação de qualquer obra, mesmo a que pretendemos ser objetiva ou científica.
Não sou historiador, nem quero ser. Ninguém tira o valor de quem tem formação acadêmica específica em História. Meu viés realmente é muito mais do cientista social e do jornalista. Creio que são áreas de conhecimento que muitas vezes se sobrepõem, em outras são complementares. Com o meu ponto de vista, procuro dar uma contribuição nova e diferente ao estudo da história do Brasil, que como toda forma de conhecimento acadêmico é construtiva, baseada no conhecimento anterior, como um edifício do saber. E, por isso mesmo, às vezes tem dificuldade de aceitar revisões.
A gente ouve opiniões as mais contrárias, e tem de respeitar mesmo aqueles que parecem se voltar contra você por alguma razão pessoal, que desconhecemos. Além de procurar desqualificar o livro, o leitor do Skoob adota um certo tom raivoso, que aparece frequentemente em gente que escreve na internet. A tolerância é o bem que mais faz falta nesta era em que todo mundo pode expressar livremente sua opinião de múltiplas formas. Porém, quem escreve deve saber que o outro tem o direito à defesa. É necessário ocupar esse espaço, para que não se disseminem o tratamento desrespeitoso, as ideias falsas e seus propósitos obscuros.
Esqueça. Não é possível agradar a todos. Daí, agrade o seu intelecto e receba seus pares com alegria. Felizmente, ainda não conseguiram criar o Ministério da Verdade, o Minivero.
ResponderExcluirVero.
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