Vejo no Facebook que uma jornalista, minha conhecida, abriu uma lanchonete. Sei de outros colegas de profissão que andam quebrando a cabeça sobre o que fazer do futuro, agora que o mercado formal de trabalho na imprensa convencional - jornais, revistas e mesmo na internet - encolheu como nunca.
Isso me lembra outra história, em outro momento, quando eu ainda saía da faculdade, em meados dos anos 1980. Na época, o Brasil andava numa crise danada, e não havia mercado para os engenheiros. Eles se formavam, mas não encontravam emprego. Sem dinheiro, o país estava parado: não havia obras, civis ou públicas. E ficou famoso, na época, um bar especializado em sucos naturais, aberto na Avenida Paulista, que se chamava, não por acaso, "O Engenheiro que Virou Suco". Um boteco com um dono altamente qualificado, mas sem espaço no seu próprio mercado. Havia então engenheiros dirigindo táxis e fazendo uma porção de outras coisas que nada tinham a ver com sua formação.
O grande problema dos veículos de mídia é um só. Numa época em que a distribuição das notícias não depende de altos investimentos em papel, gráfica e logística, ficou também fácil copiar e redistribuir conteúdo de qualidade. É inviável para a empresa jornalística fazer o seu trabalho - pagar um jornalista profissional, mandá-lo fazer a reportagem em algum lugar, numa empresa com todos os custos formais - para em cinco minutos perder a exclusividade sobre a notícia, que é imediatamente copiada e reproduzida exaustivamente por todos aqueles que não gastaram nada em sua produção.
Esse dilema da mídia impressa é dividido com a publicidade, que está ficando sem seus veículos habituais e, pior, cada vez mais é deixada de lado por clientes que dão sua informação publicitária - uma forma de notícia - diretamente para o cliente, por meio das ferramentas da rede social.
Mesmo os portais, um serviço de informação que já nasceu supostamente vocacionado para a internet, têm dificuldade de subsistir, com redações grandes e o desafio de atrair anunciantes. A pergunta é: o que será do jornalismo e do jornalista na era virtual?
Existem alguns casos exemplares, que mostram como o jornalismo está mudando, ou para onde pode ir. Glenn Greenwald (foto abaixo), o jornalista que foi o primeiro a dar as notícias sobre a espionagem americana no Brasil, especialmente nos negócios da Petrobras, é um americano que mora no Rio e passa uma parte do seu tempo na praia, passeando com o cachorro ou seu namorado brasileiro. Ele foi escolhido pelo ex-espião Edward Snowden para receber seu dossiê por três razões: 1 - No Brasil, está fora do alcance da pressão americana; 2 - É um vigilante permanente do governo americano; 3 - Seu blog está abrigado sob o guarda-chuva de um jornal de prestígio: o The Guardian.
O que se pode deduzir do jornalista mais bem sucedido dos últimos tempos é que existe uma tendência maior de os jornais serem aglutinadores de jornalistas espalhados pelo mundo, que não ganharão um salário, e sim um "frila fixo" para estarem sob o abrigo de uma marca de imprensa. Os custos caem para as empresas, que deixam de arcar com uma série de despesas. E os jornalistas não ficam à míngua. Os interesses são os mesmos: o jornal garante conteúdo exclusivo (pelo menos por alguns minutos) e de qualidade, além de atrair leitores com profissionais de renome. E os jornalistas ganham mais leitores trazidos pelo tráfego do jornal, que funcionaria assim como uma espécie de Hub de notícias.
No caso Snowden, o Guardian chegou a investir na reportagem - pagou uma passagem para Glenn encontrar-se com sua fonte de informação na Ásia. Quer dizer que o modelo do jornalismo mudou, mas o jeito como se faz o bom jornalismo, não. É possível ainda fazer bom jornalismo nos moldes atuais. E os investimentos necessários para tê-lo.
Claro que o bom jornalismo é e continuará sendo sempre necessário. As pessoas já perceberam que a internet é um mar reprodutor de boatos e erros grosseiros de informação e que informação qualificada custa - é um serviço essencial á sociedade pelo qual temos de pagar. Porém, a transição do modelo de papel, que vem encolhendo a olhos vistos, e esse futuro em um estágio auto-sustentável ainda pode demorar a acontecer. Vender suco talvez não seja o ideal de vida para um jornalista, mas talvez não existam muitos outros meios para aqueles que não se adaptarem ao novo manejo da profissão.