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quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Por que escrevo


Estou terminando de escrever um livro, que deve ser meu próximo, o mais difícil (para mim mesmo) que já escrevi. Divido ou antecipo aqui um pequeno trecho, que fala sobre a própria dificuldade de escrevê-lo. (E esse aí da foto sou eu mesmo, piqueno, objeto dessa obra).

"Deveria ser fácil, mas assumir os erros e enfrentar a nós mesmos para mudar e melhorar é uma tarefa ainda mais difícil que enfrentar os outros. Mudar é doloroso, pois no caminho temos de encarar quem somos, nossos medos, nossas falhas.

Precisamos de humildade para aceitar que não sabemos tudo, que temos problemas e que nossa felicidade depende dos outros. Isso fica muito evidente quando temos filhos. É por eles, até mais do que por nós mesmos, que devemos tentar ser melhores.

Aprendi a duras penas. O exercício de escrever é um processo de reflexão, do qual acabamos dependentes. Escrevemos não por vaidade, ou por exibicionismo, ou para ficar na posteridade, mas para viver. Seja como autor de livros de ficção como de não ficção, eu me obrigo primeiro a quebrar a casca da ostra, a encarar a verdade interior.

Depois, aceito o que nunca faço: me expor. Escancarar as portas da alma, sem segredos, é uma forma de mudar, superar a dificuldade de estabelecer uma ponte para o mundo. Ao escrever, ajudamos a nós mesmos; ao publicar o que escrevemos, a intenção é ajudar também os outros na mesma situação. O que vemos nos livros pode ser informação, ciência ou arte, mas em última análise é o aprendizado com a experiência humana, que dividimos uns com os outros.

Aquele que abre o coração expia seu sofrimento em busca de redenção. Dá o primeiro passo para a admissão de que é um ser humano. E descobre, ao abrir os braços, que os outros o acolhem. Saber que não estamos sozinhos no mundo e receber esse retorno, tanto quanto dá-lo, traz um grande alívio."

quinta-feira, 28 de março de 2019

Escritor não é profissão

Por vezes, me identificam assim, numa entrevista: "o escritor Thales Guaracy..." Ou me perguntam como é "ser um escritor".

Pode parecer estranho, mas isso para mim não tem sentido. Nunca escrevi na ficha de hotel, onde se coloca a profissão: "escritor". Nunca me referi assim a mim mesmo, nunca me apresentei dessa forma, a ninguém.

Escrever não é nada. Pelo menos, em si. Importante, para mim, são as ideias. Escrever é pensar. O resto é datilografia.

Não me defino, portanto, como escritor. Sou jornalista profissional, formado na USP. Sou bacharel em Ciências Sociais - antropologia, sociologia e política - formado também na USP. 

Na ficha, escrevo: "jornalista", para facilitar, já quem não tem muita gente que sabe o que é um cientista social. E só. (Bem, hoje em dia tem muita gente que não sabe o que é jornalista).

Você pode ser um engenheiro e escrever um livro. Isso não é ser escritor, é ser engenheiro. O mesmo se passa com um médico, um advogado. Eu escrevo também romance. Para mim, nem o romancista é escritor. É um romancista.

Como jornalista, cientista social, e também romancista, coisas que parecem tão diferentes, eu na realidade sou uma coisa só: um pensador. E, por saber como os romanos que a palavra voa, a escrita fica, ("verba volant, scripta manent", o ditado em latim), escrevo.

Escrever é a consequência do que somos, do que fazemos, e não um propósito, um fim em si. O que importa é levar adiante as ideias. E melhorar alguma coisa do mundo, quando podemos, um pouquinho.

O que escrevemos hoje estará para a civilização do futuro como estão para nós, hoje, os hieróglifos egípcios. Porém, se não fossem os hieróglifos, talvez nada se saberia do Egito, e não fosse a escrita talvez nunca tivéssemos chegado, no mundo, a alguma sabedoria.