terça-feira, 25 de novembro de 2014

A política e a máfia


Na reunião dos jurados do 59o. Esso, entre os quais eu me encontrava, não houve a menor divergência sobre qual reportagem levaria o prêmio máximo. O Esso de Jornalismo de 2014 ficou com Leonencio Nossa Jr, de O Estado de S. Paulo, que publicou em 13/10/2013 a matéria Sangue Político, resultado visível de uma longa apuração, da qual surge um retrato macabro da política brasileira.

De acordo com o levantamento feito pelo repórter, um político morre no Brasil a cada 11 dias, se a média for tomada desde 1.979. Foram 1.133 mortes de representantes públicos eleitos pelo menos uma vez nesse período. Nos últimos anos, o número de mortes aumentou. Um mapa das incidências mostra ainda que, ao contrário do que ocorria no passado, quando a lei parecia faltar somente nos rincões do sertão brasileiro, os crimes envolvendo políticos se mostram bastante distribuídos por todo o país, incluindo grandes centros urbanos de Estados como Rio, Minas e São Paulo.

Os assassinatos de políticos se devem, em alguns casos, a rixas locais que poderiam ser classificadas quase como crimes passionais. Porém, fica claro que a maior parte desses crimes é o resultado mais visível e extremo de disputas por poder e sobretudo dinheiro - acertos de contas, conquista de território e consequência de obscuras negociatas. O que a reportagem não diz, mas concluímos a partir de sua leitura, é que a política no Brasil vem sendo tomada pelas variedades da máfia - incluindo no que diz respeito aos métodos que ela utiliza para resolver conflitos de interesse.

O levantamento do Leonencio aponta para a maioria dos partidos, sem distinção. Deixa claro que mortos e mandantes não estão longe dos políticos de Brasília. E, dado mais estarrecedor, revela que cerca de 70% dos crimes políticos nem sequer são investigados pelo Ministério Público. Não parece ser um caso de incapacidade, ou excesso de trabalho. Em geral, os crimes, pela própria notoriedade dos envolvidos, dispararia o processo de investigação. Se isso não ocorre, é certamente porque quem teria o trabalho de investigar se sente inseguro ou impotente o bastante para não querer mexer com o assunto. A máfia na política é tão violenta e influente que obstroi ou intimida o trabalho da Justiça.

O júri do Esso decidiu destacar esta reportagem em especial devido ao entendimento de que, sem soluções para a política brasileira, infestada pelo crime nas suas mais variadas formas, será difícil resolver qualquer outro problema do país de maneira eficaz, seja de segurança, saúde e educação. Enquanto o dinheiro público for objeto de disputa de organizações criminosas, boa parte dele deixará de ser alocada realmente no bem público.

É preciso fazer retornar a lei ao seio do Estado, bem como restaurar o espírito do servidor público, dentro do jogo democrático, de forma pacífica e civilizada. O Brasil não pode se tornar uma terra de bandoleiros que se impõem pela intimidação e a simbiose com o poder constituído. As instituições estão aí para prevalecer sobre o crime - a começar pela própria imprensa, que vai fazendo o seu trabalho.

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