terça-feira, 26 de agosto de 2014
O resgate da literatura brasileira
Na mais recente edição da revista Observatório Cultural, do Banco Itaú, a agente literária Luciana Villas-Boas deixa um artigo importante para todos aqueles que vivem de livro no Brasil, especialmente ficção. E mais, faz um alerta especialmente para aqueles que atribuem a dificuldade dos autores brasileiros de emplacar em listas de mais vendidos à globalização do mercado, às deficiências de marketing das editoras e outras razões que não dizem respeito, essencialmente, ao produto.
O que diz Luciana é: o problema, sim, é o produto. Deixamos no Brasil de fazer literatura brasileira. Na esperança de ganhar o mundo, tentamos ser como os outros. Mas os outros ganharam o mundo sendo eles mesmos. O que os americanos vendem é literatura americana. Os franceses, idem. Gabriel Garcia Marques fez sua literatura se tornar global a partir dos recônditos da Colômbia. Eis a questão, desnudada por Luciana com clarividência: por que não literatura brasileira?
Ela pode falar da cátedra. Como editora da Record, Luciana se caracterizou pelo esforço de publicar autores brasileiros, inclusive novos. Sempre foi uma defensora da publicação de autores brasileiros no exterior. Seu empenho pessoal nisso a levou, quando deixou a empresa, em 2.012, a tornar-se agente literária. Inteligente, refinada e ativa, Luciana antes de mais nada é uma idealista, não no sentido do sujeito sonhador, mas de quem sabe que o ideal é o certo, e o certo é o ponto que se coloca adiante para alcançar o sucesso. Hoje, existem muitos agentes literários que vivem somente de vender autores estrangeiros no Brasil. O que ela viu foi a oportunidade, pela raridade de quem o fizesse, de vender autores brasileiros no exterior.
E há demanda. Recentemente, me contou ela ter vendido um jovem autor brasileiro a uma editora europeia por um dinheiro surpreendente. Segundo Luciana, o que os editores estrangeiros querem do Brasil são autores brasileiros, que falem da nossa realidade, presente ou passada; que tenham a cor, o cheiro, o gosto do Brasil. Não por acaso Jorge Amado se tornou o romancista brasileiro mais vendido do passado. Gabriela e Tieta não moravam em Nova York. O Brasil é rico em cultura, em história, e o charme brasileiro está na moda em todo o mundo. Os autores brasileiros, porém, não perceberam isso.
Pode ser que o leitor brasileiro também tenha perdido isso de vista. Sucessos como Guerra dos Tronos, Harry Potter e 50 Tons tiraram o foco ou o interesse dos leitores, sobretudo os mais jovens, da literatura nacional. Nosso maior autor no exterior hoje, Paulo Coelho, criou a onda mística que lhe permitiu ser um sucesso mundial sem falar uma única palavra sobre o país onde nasceu. Porém, trata-se de uma exceção, e um fenômeno que hoje já vai ficando datado.
Não adianta reclamar da vida ou levantar barreiras protecionistas. A saída, mostra Luciana, é fazer uma literatura brasileira de qualidade; vendedora, sim, mas genuinamente nacional. Precisamos fazer do Brasil a potência que todos esperamos na economia, mas essa presença não existe sem estar também no cinema, na literatura e nas artes de forma geral. É possível. É importante. Vamos trabalhar.
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