domingo, 14 de setembro de 2014

A era da intolerância



Jornalistas americanos são decapitados por mascarados do "Estado Islâmico". Outros mascarados, em Cascavel, Paraná, decapitam colegas presos em rebelião carcerária.

Uma mulher é vista na TV chamando o goleiro Aranha, do Santos, de macaco. O goleiro registra queixa na delegacia. A mulher vai à delegacia e se obriga a dar desculpas públicas perante a imprensa. Por fim, sua casa é incendiada.

As torcidas são clássico exemplo de intolerância e violência. Todos vão a campo para xingar e extravasar sua frustração pessoal. Se queimarmos a casa de todos que já o fizeram, o Brasil seria terra arrasada. Por sorte nem todos foram ainda filmados num gesto "anti-social". Ainda. Breve certamente será possível monitorar o que pensa, diz e faz cada torcedor.

A imolação pública de seres humanos, da mesma forma que se queimavam ou garroteavam hereges sem julgamento pela inquisição medieval, passou a fazer parte do dia a dia. Casos aparentemente sem conexão, mas que deixam a sensação de que a Humanidade na era da tecnologia paradoxalmente retorna em comportamento para a Idade Média.

A intolerância se expressa no dia a dia. No patrulhamento pela internet. Na vigilância pelas câmeras espalhadas por todo lado. No comportamento no trânsito. Nas crianças, que não se suportam, sem conseguir dividir os espaços. Até na relação entre irmãos e no casamento de pais separados, onde o compromisso nunca parece acima dos interesses dos filhos de cada parceiro ou de seus interesses individuais.

O Século XXI vai se delineando como uma combinação de Orwell e Kafka.

Como deter o barbarismo, último estágio da intolerância, esse veneno que contamina a sociedade e toma as relações sociais e de poder na sua microfísica, até chegar à violência coletiva e extremada?

Primeiro é preciso entender as causas e que as respostas não são as tradicionais. É tarde demais, ou urgente demais, para se esperar uma transformação em larga escala pela educação.

A potencialização da intolerância está diretamente ligada à era digital. Na mesma medida em que a tecnologia se desenvolveu, expondo a privacidade e o indivíduo ao seu grau máximo, o reacionarismo e a discriminação cresceram, uma reação exacerbada que se manifesta na violência cotidiana e na multiplicação de movimentos religiosos e reacionários.

O resultado é um mundo que avançou incrivelmente na tecnologia e na capacidade de comunicação, mas involuiu socialmente, na mesma e oposta dimensão. O meio virtual expõe também o que há de pior na sociedade. E faz isso estar presente num confronto diário e presente na vida de todos.

A igualdade, a liberdade de viver e de expressão, que deveriam crescer com a tecnologia da informação, são também a maior ameaça à igualdade e à liberdade como direitos humanos essenciais.

Na Internet, todos são livres; mas na realidade não há liberdade alguma, muito pelo contrário.
As forças que se reúnem no ambiente virtual, e podem vir à tona na vida real, da sua forma mais negra, mostram o novo conflito social: como controlar os agentes da sociedade que partem do ambiente virtual para se associar e criar poderes paralelos e ao mesmo tempo preservar a liberdade.

A intolerância e a violência formam um círculo vicioso, que se auto-alimenta. Criamos o mal com a mesma competência com que criamos o bem. Na era virtual, já se criaram as inquisições e as trevas. É preciso criar também um novo iluminismo. E fazê-lo prevalecer.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Rolim (o livro) está de volta


Há algum tempo, fui ver o Museu Asas de um Sonho, onde estão os aviões antigos colecionados por Rolim e João Amaro, e comprei lá os três últimos exemplares que havia da biografia que escrevi de Rolim, O Sonho Brasileiro. Há muito tempo o livro já se encontrava esgotado e a única versão disponível era uma contrafação pirata da obra, que causava algumas situações bizarras. Recentemente, por exemplo, um piloto do Paraná me enviou um email com um pedido; estava envergonhado de ter baixado o livro pirata e dizia ter gostado tanto dele que fazia questão de me pagar. E queria saber como.

Para todos aqueles que procuram pelo livro e não acham, ou que leram mas gostariam de tê-lo também na sua biblioteca digital, O Sonho Brasileiro está sendo relançado em e-book, disponível em todas as redes importantes, a começar pela Amazon, ao preço de 9,90 reais.

Revendo a obra, mais de dez anos após seu lançamento, e da morte de Rolim, a impressão que tenho é de que sua história já não funciona mais como um case de negócios ou de marketing - a maioria das coisas que Rolim fazia já não cabe na realidade de hoje, mesmo para a TAM, a companhia que fundou. Tudo parece pitoresco, arriscado, ousado demais para os dias de hoje. No entanto, a obra conserva um grande interesse, por dois motivos.

Primeiro, pela história aventuresca de Rolim, um tanto romãntica, ou picaresca, desde os tempos em que se aventurava em voos como piloto privado no desbravamento da Amazônia, um tempo pioneiro como não haverá outro mais.

O segundo motivo pelo qual o livro continua importante é o retrato de uma época em que os empresários ainda lutavam pela liberdade de fazer, de empreender, de buscar o melhor para as empresas, os clientes e a economia. Um tempo fechado pela ditadura militar, que criava reservas de mercado e entraves que faziam a economia brasileira ser comparável em atraso à da soviética. Rolim estava na linha de frente desse combate, e entender sua história é também entender a trajetória recente da economia brasileira.

Pra quem quiser conferir, o link na Amazon:

http://www.amazon.com/Sonho-Brasileiro-Portuguese-Thales-Guaracy-ebook/dp/B00NBXKY36/ref=sr_1_1?ie=UTF8&qid=1410194168&sr=8-1&keywords=thales+guaracy+sonho+brasileiro

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Lucy e o sentido da inteligência



Assisti Lucy, o filme de Luc Besson com Scarlett Johansson e Morgan Freeman, que acaba de entrar em cartaz no cinemas, e deve também sair em breve, como hoje em dia costuma acontecer. Um filme estranho, sob muitos aspectos; aquela velha e boa sensação de estranheza de que algo ali merece ser explorado, como acontece com grandes filmes de ficção cientifícia, como 2001, Uma Odisséia no Espaço, de Kubrick, ou Solaris, de Andrei Tarkovski.

A primeira estranheza, na verdade, vem da combinação que deu origem à produção: um cineasta francês, a quem se entregou a tecnologia dos grandes estúdios americanos. O resultado é um Frankeinstein cinematográfico: ao mesmo tempo em que procura fazer um filme de ideias, ao estilo francês, Besson cede aos efeitos especiais e a velhos chavões do consumo de massa: o vilão implacável e sua gangue, a perseguição de carros e o policial honesto que se mete na história por acaso. Por trás disso, porém, há uma ideia melhor, mais profunda e interessante.

Sob o impacto de uma overdose involuntária de drogas que carrega em um saco costurado no ventre, Lucy vai atingindo progressivamente 100% do uso do seu cérebro; resultado de uma reação em cadeia da inteligência, equivalente a de uma bomba nuclear. Com ela, podemos nos fazer muitas perguntas; sobretudo, nos aproximamos do conceito de que não existe a morte. E que o verdadeiro sentido da inteligência é o da busca pela imortalidade.

Nos acostumamos a pensar que somos o nosso corpo; o filme de Besson nos lembra que o corpo não importa. Vivemos querendo ser a árvore, regá-la, apará-la, conservá-la por mais tempo que pudermos, mas ela nunca deixará de ser perecível. Lucy entende que a única forma de sobreviver é não ser árvore, é entrar para a natureza, que nunca morre. A evolução do ser humano é abandonar o corpo perecível para ser somente uma forma de inteligência.

Estranho? Pode ser, mas aí está um intrigante caminho, e quem sabe uma visão do futuro, baseada nas possibilidades humanas. Muitas vezes a ficção científica mostra soluções; a própria física começa como uma investigação filosófica, para depois ser demonstrada em fórmulas matemáticas. O filme escorrega nos americanismos, e às vezes alguma cenas parecem patéticas, como o encontro de Lucy com sua versão antropóide, primeiro espécime da desenvolver a inteligência que consideramos humana, ou sua subida pelas paredes, que mais lembra carrie, a Estranha. Porém, não há pasteurização capaz de derrubar o fato de que, ali, há algo interessante no ar, e cada um pode tirar disso suas próprias conclusões.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O curso Escreva Bem, Pense Melhor volta à Livraria da Vila


Na segunda semana de outubro, o curso escreva Bem, Pense melhor voltará a ser ministrado no auditório da Livraria da Vila, na Vila Madalena, em São Paulo.

Duração: 6 encontros de 2 horas

Objetivo

O exercício de escrever traz benefícios que vão além da própria escrita. O aperfeiçoamento da escrita desenvolve o raciocínio organizado. Ele nos ajuda a pensar melhor. E pensar melhor também nos faz escrever melhor, com textos capazes tanto de exprimir o seu autor quanto de atrair o interesse dos leitores.

Encontros

1. O desafio do papel em branco. Como escrever bem. A força das ideias. Escrita e pensamento. Texto e linguagem falada.
2. O pensamento estruturado. Clareza, interesse, relevância. Abertura, desenvolvimento e fecho. A primeira frase. Encadeamento e lógica.
3. A forma e o raciocínio: redação e estilo. Texto jornalístico e informativo. Conteúdo, informação e notícia. Síntese, concisão e outras normas estilísticas.
4. Os elementos da criação. Escrita, emoção, autoanálise e desenvolvimento pessoal. “Inspiração”: os elementos da criação. O texto como expressão individual: diário, blog, autobiografia, memórias. As formas literárias: o conto, a crônica, a novela, o romance. Primeira pessoa, o texto opinativo, a crônica e o texto memorialístico. A ironia e o humor. Estilo e individualidade.
5. Estudo de caso. Workshop
6. Adequação ao público. Comunicação corporativa. Impacto. Público segmentado ou dirigido. Mensagem e linguagem.

terça-feira, 26 de agosto de 2014

O resgate da literatura brasileira



Na mais recente edição da revista Observatório Cultural, do Banco Itaú, a agente literária Luciana Villas-Boas deixa um artigo importante para todos aqueles que vivem de livro no Brasil, especialmente ficção. E mais, faz um alerta especialmente para aqueles que atribuem a dificuldade dos autores brasileiros de emplacar em listas de mais vendidos à globalização do mercado, às deficiências de marketing das editoras e outras razões que não dizem respeito, essencialmente, ao produto.

O que diz Luciana é: o problema, sim, é o produto. Deixamos no Brasil de fazer literatura brasileira. Na esperança de ganhar o mundo, tentamos ser como os outros. Mas os outros ganharam o mundo sendo eles mesmos. O que os americanos vendem é literatura americana. Os franceses, idem. Gabriel Garcia Marques fez sua literatura se tornar global a partir dos recônditos da Colômbia. Eis a questão, desnudada por Luciana com clarividência: por que não literatura brasileira?

Ela pode falar da cátedra. Como editora da Record, Luciana se caracterizou pelo esforço de publicar autores brasileiros, inclusive novos. Sempre foi uma defensora da publicação de autores brasileiros no exterior. Seu empenho pessoal nisso a levou, quando deixou a empresa, em 2.012, a tornar-se agente literária. Inteligente, refinada e ativa, Luciana antes de mais nada é uma idealista, não no sentido do sujeito sonhador, mas de quem sabe que o ideal é o certo, e o certo é o ponto que se coloca adiante para alcançar o sucesso. Hoje, existem muitos agentes literários que vivem somente de vender autores estrangeiros no Brasil. O que ela viu foi a oportunidade, pela raridade de quem o fizesse, de vender autores brasileiros no exterior.

E há demanda. Recentemente, me contou ela ter vendido um jovem autor brasileiro a uma editora europeia por um dinheiro surpreendente. Segundo Luciana, o que os editores estrangeiros querem do Brasil são autores brasileiros, que falem da nossa realidade, presente ou passada; que tenham a cor, o cheiro, o gosto do Brasil. Não por acaso Jorge Amado se tornou o romancista brasileiro mais vendido do passado. Gabriela e Tieta não moravam em Nova York. O Brasil é rico em cultura, em história, e o charme brasileiro está na moda em todo o mundo. Os autores brasileiros, porém, não perceberam isso.

Pode ser que o leitor brasileiro também tenha perdido isso de vista. Sucessos como Guerra dos Tronos, Harry Potter e 50 Tons tiraram o foco ou o interesse dos leitores, sobretudo os mais jovens, da literatura nacional. Nosso maior autor no exterior hoje, Paulo Coelho, criou a onda mística que lhe permitiu ser um sucesso mundial sem falar uma única palavra sobre o país onde nasceu. Porém, trata-se de uma exceção, e um fenômeno que hoje já vai ficando datado.

Não adianta reclamar da vida ou levantar barreiras protecionistas. A saída, mostra Luciana, é fazer uma literatura brasileira de qualidade; vendedora, sim, mas genuinamente nacional. Precisamos fazer do Brasil a potência que todos esperamos na economia, mas essa presença não existe sem estar também no cinema, na literatura e nas artes de forma geral. É possível. É importante. Vamos trabalhar.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Vai Antonio Ermírio, ficam seus valores



Em meados da década de 1.990, quando eu trabalhava no grupo Exame, publiquei uma entrevista do ex-governador Orestes Quércia, na qual este acusava a família Mesquita, dona do jornal O Estado de São Paulo, de corrupção - teria usado sua influência na imprensa para obter empréstimos favorecidos do BNDES. A família Mesquita processou Quércia pela acusação, e este processou os Mesquita de volta. O caso, em si, obviamente não deu em nada. Porém, ficou disso uma estranha amizade. Uma vez por ano, eu era chamado ao Fórum da Lapa, em São Paulo, assim como o empresário Antonio Ermírio de Moraes e o banqueiro Olavo Setúbal, os três arrolados como testemunhas. A família Mesquita e Quércia, os principais interessados no processo, nunca compareceram ao fórum. Eu, porém, Ermírio e Setúbal, estávamos sempre lá. Uma vez por ano, durante cerca de cinco anos, nos encontrávamos pontualmente no Fórum. E ficávamos batendo papo, até que o juiz, ao ver que as partes efetivamente não compareciam, acabava por nos dispensar.

Era um prazer conversar com ambos. Nesses encontros, discutia-se sempre a ética. Tanto Setúbal quanto Ermírio eram pessoas ocupadíssimas. Porém, davam valor e respeitavam a justiça em primeiro lugar. Ermírio, sobretudo, fazia questão de não se portar como costumam fazer os poderosos, que se acham pairando sobre a lei ou, esquecidos dos princípio básicos da igualdade humana, do respeito e da humildade, deixam de fazer aquilo que é obrigação de cada um. Mais do que um dos líderes da Votorantim, ao lado de seu irmão José, Ermírio se tornou conhecido pela ética do trabalho, da qual era o grande pregador. E fazia questão de ir muito além de suas obrigações. Mesmo tendo a maior companhia privada do Brasil para tocar, desdobrava-se para fazer seu trabalho administrativo - e benemerente - no hospital Beneficência Portuguesa.

Quando inaugurou o hospital São José, que pretendia transformar num centro de excelência, tive o prazer e a honra de comunicar a ele que receberia o título de Paulistano do Ano, concedido pela revista Veja S. Paulo, que me pediu para escrever um perfil dele. Hoje, esse perfil se encontra publicado em livro ("Eles Me Disseram, Editora Saraiva/Versar). Nessa ocasião, em que me recebeu sem muito apreço pelo prêmio, como por qualquer prêmio, mas atencioso com o jornalista e feliz com a realização do hospital, "doutor Antônio" se deixou conhecer um pouco mais.

A morte de Antônio Ermírio, aos 86 anos, assim como a de Setúbal, deixa a marca de um brasileiro incansável, patriota e exemplar. Rico como era, mas levando uma vida relativamente espartana, totalmente voltada para os 9 filhos e o trabalho, ele se tornou líder pelo comportamento. Uma breve experiência na política mostrou-lhe que esse mundo não lhe servia, e que fazia mais pelo país como simples cidadão e empresário. Avesso à demagogia, criticava políticas assistencialistas, como a do Bolsa Família. Seu foco era a geração de emprego e a valorização do cidadão pela educação e o trabalho.

Sem Ermírio, fica-se com a impressão de que o Brasil perdeu um de seus pilares. Porém, se os homens vão, seus valores ficam. O Brasil precisa de muitos Ermírio, que lutem pela saúde, educação e trabalho de forma honesta e incansável. Pessoas que se orgulhem de pagar impostos e capazes de doar parte de seu tempo e capacidade às causas coletivas. Pessoas que prefiram às vezes trilhar o caminho mais difícil, pelos frutos mais duradouros que renderão no futuro, do que ceder às facilidades momentâneas ou à tentação do golpe empresarial ou eleitoreiro.

Não vou ao seu velório, nem ao seu enterro. Vou trabalhar, a melhor homenagem que neste momento poderia lhe prestar. Ermírio para mim está vivo, pois sua missão nunca se acaba, mais importante do que nunca.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

A redescoberta do Brasil

Meu novo livro, que sai pela Editora Planeta: a revisão da descoberta do Brasil, uma história épica, irônica, às vezes fantástica, com prefácio de Laurentino Gomes



Por muito tempo, sem entender bem os motivos secretos que por vezes nos fazem agir, colecionei livros e material sobre a descoberta e a colonização do Brasil. Obras dos primeiros cronistas, ensaios, teses, livros de História. Mapas, desenhos, gravuras. Por alguma razão, sempre tive vontade de rever o começo do Brasil, que sempre me pareceu uma história épica, irônica, às vezes meio fantástica. E que também sempre me pareceu muito abreviada nos livros de História, às vezes mal interpretada, ou ainda despida das cores da realidade.

Temos grandes obras teóricas, ou ensaísticas, como de Sérgio Buarque de Hollanda e Darcy Ribeiro. Temos muitos livros didáticos. E temos livros de história escritos no passado mais distante, sem os mesmos recursos de hoje, com o acesso que há à informação e uma visão mais contemporânea dos fatos. E eu queria reconstituir a história do Brasil como numa grande reportagem, que fosse algo mais vivo, mais próximo da verdade, em que se pudesse não apenas entender como ver o que aconteceu.

Neste ano, em que tive oportunidade de voltar a escrever, meu livro sobre as origens do Brasil começou a surgir. Há duas semanas, coloquei ponto final, entre orgulhoso e desancado por meses pregado à minha cadeira Aeron. O trabalho de reconstrução, ou de restauração, foi muito enriquecido por uma sorte conjuntural. Graças à internet, muitas obras raras e antigas se tornaram disponíveis para consulta, dos historiadores clássicos aos textos originais de jesuítas e exploradores. Aos poucos, fui refazendo o percurso de nossa história. E, pela primeira vez na vida, creio ter entendido, de fato, o Brasil. Da maneira como precisa ser feito: desde as raízes.

Aos poucos amigos com quem conversei nesses meses de trabalho, expliquei por que coloquei isso na frente de escrever ficção. A ficção preenche com ajuda da imaginação os espaços vazios entre os acontecimentos, coloca vida, emoção e gesto nos personagens. E temos, na descoberta do Brasil, personagens monumentais. Mas ela não pode fazer isso à custa de erros ou interpretações equivocadas da história. Talvez eu ainda venha a escrever um romance sobre a colonização do Brasil, mas para isso precisava primeiro estudar a fundo e entender o que aconteceu. Com isso, espero dar também uma contribuição do jornalismo contemporâneo ao entendimento da nossa história.

Hoje em dia, devido ao trabalho de jornalistas como Laurentino Gomes, estamos modernizando a história do Brasil, revendo nosso passado, para tirar dele a poeira e as deturpações, em busca de uma visão mais realista e profunda do país. A revisão da História é uma prova de que o passado pode mudar. Com uma visão mais moderna, informação e novos achados, revemos o que aconteceu, tanto os fatos como a interpretação dos fatos. Laurentino, que faz isso muito bem, e entende a importância desse trabalho, que é coletivo, gentilmente aceitou a tarefa de escrever uma apresentação deste novo livro.

O livro sairá apenas no começo do ano que vem, pela Editora Planeta. O lançamento coincidirá com as comemorações do aniversário de 450 anos da cidade do Rio de Janeiro, que foi um marco fundamental na colonização portuguesa do Brasil. A partir da fundação do Rio, por paulistas e portugueses, é que a costa brasileira efetivamente se tornou uma colônia portuguesa. Por isso, essa reconstrução do Brasil é também uma homenagem à cidade que, além de maravilhosa, tem uma importância capital em nossa história e na cultura brasileira.